Os cabelos negros,compridos e oleosos, o vestido longo e rasgado assustavam quem passava e a via sentada na escada da igreja. Diziam que era uma bruxa, mas havia quem soubesse qual o seu nome e onde um dia vivera…
Para muitas pessoas ela era so mais uma desgraçada que tinha destruido a sua vida. Para algumas ela era uma infeliz vitima do destino.
O seu nome era Ester. A minha avo contava que a Ester fora um dia uma linda criança de caracois negros e mais tarde uma espantosa mulher. Desde pequena trabalhara para ajudar os pais com o alimento dos cinco irmaos mais novos. Era meiga e educada para todas as pessoas da vila. Cresceu agarrada ao cabo da enxada, com maos calejadas, que a primeira coisa que faziam pela madrugada era amassar a massa do pao, mais tarde vendido pela mae de porta em porta.
A minha avo contava que a Ester era cobiçada por tudo quanto era homem mas nao se iludia com nenhum.
Um dia, enquanto conversava com as amigas a porta da igreja, viu um trevo de quatro folhas no chao. Dizia-se na altura, que se se encontrasse um trevo de quatro folhas a frente de uma igreja, se deveria rezar um Pai-nosso e pedir um desejo. Ester pediu o seu desejo, rezou o Pai-nosso, e guardou o trevo por baixo do seu colchao.
Duas semanas mais tarde, novamente em frente a igreja, enquanto conversava com as raparigas da sua idade, ele surgiu, qual principe encantado. Era alto, bem constituido, olhos escuros, cabelo preto, pele morena. Quando sorriu ela perdeu-se naquele sorriso de dentes perfeitamente alinhados. Nao demorou muito até se encontrarem vezes sem conta. Ao inicio em frente a igreja, onde conversavam na presença de mais pessoas. Depois, por tras da igreja, sozinhos, sucumbiam ao amor e a paixao.
Passaram algumas semanas, até Ester perceber que a sua menstruaçao nao chegava e temeu o pior. Quando contou ao seu amor, ele prometeu leva-la para longe e faze-la feliz, juntamente com a criança gerada por ambos. No entanto, no dia seguinte nao apareceu em frente a igreja. Ester esperou dias a fio, sem sair dali. Nao comia, nao bebia, so chorava. Ao fim de uma semana foi a mae que a arrancou das escadas frias. Quando a jovem contou ao pai o que se passara, este espancou-a. Era uma rameira, indigna da familia que tinha e merecia morrer. Quem a tirou debaixo da ira do pai foi a mae, chorosa, e atirou-a para a rua. Toda rasgada e a escorrer sangue, Ester soube naquele momento que estaria sozinha no mundo, pois ja nem a criança, que o seu ventre carregara horas antes, existia.
Foi entao que Ester voltou para a frente da igreja. Ali esperava por ele, ali bebia recordaçoes e comia sonhos. Ali sobrevivia.
Se Ester tivesse nascido uns bons anos mais tarde o seu destino poderia ter sido diferente. Assim, foi so mais um martir nas maos de uma sociedade machista.
Quando se ouviu um grito vindo da porta da igreja, naquela manha de primavera, a vila soube. Ester havia morrido. De fome, de sede, de frio, de tristeza? De injustiça, desamparo e humilhaçao por parte do Mundo.
Historia minha e ficticia para a Fabrica de Historias